sexta-feira, 1 de março de 2013
Wilma Célia Cativo Rosa (de Araújo).
Wilma Célia era um astro que sempre espelhava, com muita vantagem, o brilho das estrelas. Estrelas aparecem, são centro de atenções. Astros refletem seus brilhos. O sol é uma estrela de quinta grandeza. A terra é um astro que lhe orbita, entrega a seiva de sua vida a sete bilhões de seres humanos. Quem seria mais importante? O sol com sua majestade, ou a mãe-terra, nutriz, carinhosa, silente e imprescindível? Pensei em relatar minha quase extensa biografia de vida ao lado de minha prima Wilma Célia Cativo Rosa de Araújo mas julguei, como também fui carinhosamente advertido de que poderia esquecer personagens e ser injusto. Então decidi ir no geral. Wilma era minha prima, enredada pelo meu sangue e de outras seivas amigas, por todos os lados. Era a segunda na nossa linhagem em Belém, que começava com Ilma, também já partida, e que terminava em mim, até 1956 quando apareceu o intruso do Manoel Abreu (saudades meu primo). Certamente não era por eu ser o caçula da cidade. Era de sua índole. Suas bonecas eram imensas, maiores do que ela, a espraiar o sentimento latente de maternidade que demonstraria ao longo de sua vida, com todos, eu digo TODOS que, pelo menos, cruzaram com ela numa viela ou beco. Tenho certeza que ela abriu aquele sorriso escancarado, quando não soltou a gargalhada, permanente moradora da rua de seus lábios. Existem pessoas, poucas pessoas, que conseguem sorrir com os olhos, mesmo estando tristes. Assim era Wilma Célia, ainda que catando a odiosa cebola cozida em meio ao arroz, à qual comparava com lesmas. Sem ser star ou starlet, a gente nem percebia mas tudo girava em sua volta. Elemento catalisador de paz, amor e harmonia. Nunca entendo como ela jamais cansou ou enfadou-se desse papel. Nós, paraenses, sempre tivemos na família nuclear um bem maior e insubstituível, mesmo depois da nova família, aquela que surge com o casamento. Muito criança, voando nas divagações de meus quatro anos e verificando já a saúde claudicante de minha mãe, pensei centenas de vezes, um clarão até então inconfesso e agora dito, como se o tirasse dos porões de uma ditadura do tempo ou amamentado por alguma utilidade: se mamãe morrer vou pedir ao papai pra morar na casa da Tia Carmita. Lá tenho ela (que me soava como uma substituta materna com as vantagens de não me punir, nunca), Tio Nequito (que me chamava de "tio" e me cumulava de beijos, atenções e muito amor), Cláudio (meu irmão, companheiro de paixões clubísticas e folguedos mais varonis), Venise (a mais próxima em idade e companheira de brincadeiras desde o gol a gol até as panelinhas pra fazer as sopas de capim) e, por último mas nunca menos importante), Wilma (a paz e a segurança como a serpente esculpida no deserto para acalmar e guiar o povo de Israel em seu desesperançoso êxodo). Bastava trocar um olhar de dois segundos e o sorriso desmanchava qualquer amargura. Soa improvável, mas é verdade: meu irmão Antonio André, "transferido" pra casa da vovó onde estava Tia Carmita que tinha ido cuidar dela em seus últimos momentos, tinha fraturado expostamente tíbia e fíbula; o gesso vinha da virilha ao calcanhar tornando o calor e a coceira insuportável naquele fevereiro de 1958. Quando o desespero era muito grande ele gritava WIIIIIIIIIILMA e ela, já sabendo do que se tratava, sentava num banquinho, punha aquela perna engessada em seu ombro e ficava às vezes duas ou três horas conversando para passar o tempo e diminuir o inchaço. Ou ainda, arghhhhhhhhhhhh, só ela era capaz de deitar a meu lado, no cair da tarde, para catar oxiúros desesperados pelo calor. Eu não precisava pedir pois ela escutava meu choromingar de longe. Com isso mais os remédios engolidos, me curei em dois dias.Quem não viveu ou conviveu com Wilma, maintenant c'est fini (parva homenagem ao francês que ela estudava na Aliance Française); acabou a possibilidade material. Agora só no sonho, na imaginação e na esperança de um paraíso no porvir. Wilma é muito mais que tudo isso. Jamais estive tão perto de uma encarnação tão perfeita do amor e da paz. Um dia, minha irmã mais velha, meu porto e segurança nos momentos mais delicados dos pânicos infantis, um dia, possuo mais que esperança a certeza de que estaremos, novamente, ao alcance de um olhar. Enquanto isso, vai emprestando esse brilho todo, não como mera estrela encantada, mas como astro de grandeza incomensurável, paridor e mantenedor, nas galáxias nutrizes e lactantes das partes mais recônditos e importantes do Universo. Aquelas que imitam os peitos das mães, fartos de leite e amor. Realmente, descansa em paz e me perdoa, ainda que tardiamente, por alguma coisa que deixei respingar em teu imaculado manto de estrelas!
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