Em 1963, ainda morando em Belém, convivi cerca de dois meses com uma família venezuelana que visitava Belém para conhecer os parentes de sua mãe, membro de conhecida família paraense. Pai e mãe ficaram na Venezuela e, aos poucos, fui descobrindo algo mais sobre aquela família. O pai era o maior acionista e presidente do Banco del Caribe. Os três filhos que vieram ao Brasil (o mais velho ficou na Venezuela) eram jovens na faixa de 15 a 20 anos e algumas coisas me chamavam a atenção. Eram muito refinados, demais até para que eu me sentisse à vontade perto deles. Não alardeavam riqueza mas se percebia que pertenciam à alta elite financeira daquele país a contar de detalhes incomuns, pelo menos aos meus olhos, mas que eram absolutamente corriqueiros em seu dia a dia. As fotos dos Mercedes e BMW's da família me impressionaram, porém não mais que o imenso palácio que residiam em meio a uma "quinta" encravada numa espécie de colina da qual se tinha bela vista do Mar do Caribe. Quando queriam comentar coisas em off falavam em inglês e muito rápido. Todos foram educados nos Estados Unidos, desde o High School até a Universidade em mais de um nível. O patriarca veio a Belém passar uns três dias e foi incensado como personalidade internacional que efetivamente o era. Depois do retorno deles a Caracas, só tive notícia do "velho" através já do Jornal Nacional noticiando seu sequestro, já nos anos 70, por grupo guerrilheiro local, tendo sido libertado após o pagamento de resgate nunca confirmado mas especulado como sendo de mais de um milhão de dólares, montante que era enorme fortuna à época. O que mais eu estranhava era o completo desconhecimento deles sobre as coisas de seu país. Praticamente muito pouco ou nada sabiam sobre a Venezuela, ante minha insistência em especular sobre a vida, costumes e o povo venezuelano, em minha imensa curiosidade que instiga jovens de 15 anos de idade como eu. Mostravam-se profundamente arraigados à cultura norte-americana como se houvessem nascido, além de aculturados, educados e socializados no gigante do norte. Quanto à Venezuela, demonstravam uma certa ignorância exceto quanto à História e, principalmente, admiração pelos feitos libertários de Simón Bolivar contudo, somente sob um ângulo de patriotismo xenófobo. Lembro que falavam da participação do Mariscal nas guerras de independência do Peru, Bolívia (a quem emprestou o nome ao país), Colômbia, Equador e Panamá. Também citavam seu jovem seguidor o Mariscal Sucre, morto aos 35 anos. Tinham veneração pelos dois. Esse foi o contato que tive com a Venezuela, fora dos meus estudos em História oficial da América Latina, especialmente Hispânica. Poucos anos depois, para ser mais específico, em 1965, já morando em Brasília com meu irmão André, hospedamos em nosso apartamento o jovem Hugo Arango Hernandez (ou seria Fernandes?). Era um jovem Colombiano de Medellin, filho de um renomado advogado de Classe Média Alta casado com a prima do então presidente Carlos Lleras Restrepo. Tinha tudo para seguir a carreira do pai mas, ao terminar com muito destaque o Curso de Direito, foi-lhe oferecido escolher o quê fazer em comemoração ao evento. Decidiu pedir ao pai algum dinheiro, juntou roupas e outros produtos de primeira necessidade e decidiu passar um ano viajando pela América Latina, misturando-se ao povo e conhecendo a realidade in locco. Eu vinha de Belém, garoto de 17 anos completamente alienado da política. Foi nesse querido "antro" que tive minhas primeiras lições de vida vindas de meu irmão André (então agnóstico e Marxista teórico), meu irmão por escolha José Araripe (ateu e de esquerda), Xavier (agnóstico e livre-pensador com tendências de centro direita); só eu era cristão, protestante, pentecostal e disciplinbado na Assembleia de Deus de Belém, a Igreja-Mãe. Mas me encantava mesmo, num período onde as aulas ainda não tinham começado, enxergar a América Latina pelos olhos de Hugo. Foi dele que ouvi, há tantos anos, que 1/3 do território colombiano já não eram dominados pelo Estado, dividido entre três facções guerrilheiras entre as quais as FARC eram a mais importante e que, com efeito, dominariam as demais em pouco tempo. Sua descrição da guerrilha na selva boliviana era um filme de aventuras reais, para mim. A viagem pelo Chile nos vagões da Transandina me levava ao paroxismo das emoções de um livro de realismo fantástico. Sua passagem pelo Paraguai, incluindo a Província do Chaco, era como rever aulas de História, só que não a Oficial. Foi aí que entendi a covardia da Triple Entente contra um pequeno país de povo heroico, a humilhação que lhes foi imposta por D. Pedro II, o ódio e ressentimento contra os brasileiros e a consideração do nosso país como imperialista frente aos Guaranis. Foi Hugo que me falou da existência dos Montoneros argentinos e Tupamaros uruguaios. Mas, o que mais me interessa agora, é lembrar sua descrição sobre a Venezuela. Até aquele dia de extensa aula, a única visão que tinha de nosso grande vizinho ao norte, eram cartões postais de centenas de postos de petróleo espalhados pela Baía de Maracaibo e fotos de praças bem cuidadas e com estátuas equestres de Bolívar e Sucre. Foi Hugo que me relatou o drama do povo venezuelano, espalhado por imensas favelas miseráveis no entorno de Caracas; uma cruel distribuição de renda que apenas permitia a existência de duas classes sócio-econômicas: riquíssimos, como nosso banqueiro acima e absolutamente miseráveis, todo o resto. Não havia classe média, produção, nada! A Venezuela era um apêndice dos Estados Unidos da América, como se fosse um Porto Rico ou um Havaí só que produzindo petróleo a rodo, barato e TODO exportado para os americanos, via das suas companhias petrolíferas que dominavam o mercado em um oligopólio monolítico. Hugo foi meu mentor e professor de Marxismo Humanitário, aquele que mantém o espírito crítico, não esbraveja pelo fanatismo nem comemora a "união das classes operária e campesina" com Whiskey escocês nos happy hours acompanhando a tchurma do PPS. Quando Chávez assumiu o poder, em 1998, fui tendo notícias do quê ele estava fazendo pelas massas miseráveis da Venezuela. Praticamente acabou com a miséria, sempre com programas de aumento nominativo de renda, como se faz no Brasil. Nacionalizou o que pode e empurrou as elites para seu devido lugar. Evidente que qualquer pessoa que teve saciada sua fome e aumentado seus horizontes, não se preocupou em saber o quê estava sendo feito para perenizar essas medidas. Aí Chávez, como todos os caudilhos da neo-esquerda, fez o que todos fazem: trocou as bolas, assumiu poderes ditatoriais e não exercitou qualquer planejamento para enfrentar o futuro. Castro, Stalin, Mao e todos os grandes líderes da esquerda pragmática, a seus tempos, foram diminuindo injustiças sociais seculares, garantindo um mínimo de dignidade humana à população antes desassistida, com boa educação, saúde pública e um mínimo padrão alimentício acima da linha da fome. As ações de Lula, Morales, Correia e Chávez, na América Latina, procuraram militar nesse sentido mas sempre tentados pela mosca azul do poder incontrolável e do pensamento único que leva, e levou a todos, a ditaduras muitas vezes sanguinárias, anulação dos contrários, eternização no poder, castração das liberdades de pensamento e de ir e vir. Em nome do pão, do ovo, do hospital e da boa escola, retiraram do povo o direito de sonhar com algo mais, sempre achando que o que vem depois do essencial é sempre a praga capitalista. O homem que morreu há algum temps e foi só ontem declarado oficialmente morto, teve tudo (a força do povo a seu lado) para construir um paraíso na Venezuela. Mas, como seus companheiros de socialismo bolivariano e caboclo, trocou tudo isso por um projeto pessoal de assalto e escalada ao poder a todo custo. Chávez deixa uma Venezuela incerta, sem parque industrial, importando tudo o que consume, desde alimentos pois não há agricultura nem pecuária, com uma hiperinflação já instalada, ou seja, jogou no lixo todo o humanismo que conquistou, encantado com o canto de Penélope, inebriante e embriagador, do poder a todo custo, do poder pelo poder. Como se viu, não era imortal e a incerteza paira sobre o futuro do país. Nu fundo, o Comandante não preparou a sua sucessão, como o fizeram Lula e os Castro e parecem pouco fazer Morales, Correia e Christina Kirschner. Pois é justamente nessas horas que a direita se ajeita na poltrona, dá o bote e vai tudo por água abaixo. Simples assim!
quarta-feira, 6 de março de 2013
Mazelas venezuelanas!
Em 1963, ainda morando em Belém, convivi cerca de dois meses com uma família venezuelana que visitava Belém para conhecer os parentes de sua mãe, membro de conhecida família paraense. Pai e mãe ficaram na Venezuela e, aos poucos, fui descobrindo algo mais sobre aquela família. O pai era o maior acionista e presidente do Banco del Caribe. Os três filhos que vieram ao Brasil (o mais velho ficou na Venezuela) eram jovens na faixa de 15 a 20 anos e algumas coisas me chamavam a atenção. Eram muito refinados, demais até para que eu me sentisse à vontade perto deles. Não alardeavam riqueza mas se percebia que pertenciam à alta elite financeira daquele país a contar de detalhes incomuns, pelo menos aos meus olhos, mas que eram absolutamente corriqueiros em seu dia a dia. As fotos dos Mercedes e BMW's da família me impressionaram, porém não mais que o imenso palácio que residiam em meio a uma "quinta" encravada numa espécie de colina da qual se tinha bela vista do Mar do Caribe. Quando queriam comentar coisas em off falavam em inglês e muito rápido. Todos foram educados nos Estados Unidos, desde o High School até a Universidade em mais de um nível. O patriarca veio a Belém passar uns três dias e foi incensado como personalidade internacional que efetivamente o era. Depois do retorno deles a Caracas, só tive notícia do "velho" através já do Jornal Nacional noticiando seu sequestro, já nos anos 70, por grupo guerrilheiro local, tendo sido libertado após o pagamento de resgate nunca confirmado mas especulado como sendo de mais de um milhão de dólares, montante que era enorme fortuna à época. O que mais eu estranhava era o completo desconhecimento deles sobre as coisas de seu país. Praticamente muito pouco ou nada sabiam sobre a Venezuela, ante minha insistência em especular sobre a vida, costumes e o povo venezuelano, em minha imensa curiosidade que instiga jovens de 15 anos de idade como eu. Mostravam-se profundamente arraigados à cultura norte-americana como se houvessem nascido, além de aculturados, educados e socializados no gigante do norte. Quanto à Venezuela, demonstravam uma certa ignorância exceto quanto à História e, principalmente, admiração pelos feitos libertários de Simón Bolivar contudo, somente sob um ângulo de patriotismo xenófobo. Lembro que falavam da participação do Mariscal nas guerras de independência do Peru, Bolívia (a quem emprestou o nome ao país), Colômbia, Equador e Panamá. Também citavam seu jovem seguidor o Mariscal Sucre, morto aos 35 anos. Tinham veneração pelos dois. Esse foi o contato que tive com a Venezuela, fora dos meus estudos em História oficial da América Latina, especialmente Hispânica. Poucos anos depois, para ser mais específico, em 1965, já morando em Brasília com meu irmão André, hospedamos em nosso apartamento o jovem Hugo Arango Hernandez (ou seria Fernandes?). Era um jovem Colombiano de Medellin, filho de um renomado advogado de Classe Média Alta casado com a prima do então presidente Carlos Lleras Restrepo. Tinha tudo para seguir a carreira do pai mas, ao terminar com muito destaque o Curso de Direito, foi-lhe oferecido escolher o quê fazer em comemoração ao evento. Decidiu pedir ao pai algum dinheiro, juntou roupas e outros produtos de primeira necessidade e decidiu passar um ano viajando pela América Latina, misturando-se ao povo e conhecendo a realidade in locco. Eu vinha de Belém, garoto de 17 anos completamente alienado da política. Foi nesse querido "antro" que tive minhas primeiras lições de vida vindas de meu irmão André (então agnóstico e Marxista teórico), meu irmão por escolha José Araripe (ateu e de esquerda), Xavier (agnóstico e livre-pensador com tendências de centro direita); só eu era cristão, protestante, pentecostal e disciplinbado na Assembleia de Deus de Belém, a Igreja-Mãe. Mas me encantava mesmo, num período onde as aulas ainda não tinham começado, enxergar a América Latina pelos olhos de Hugo. Foi dele que ouvi, há tantos anos, que 1/3 do território colombiano já não eram dominados pelo Estado, dividido entre três facções guerrilheiras entre as quais as FARC eram a mais importante e que, com efeito, dominariam as demais em pouco tempo. Sua descrição da guerrilha na selva boliviana era um filme de aventuras reais, para mim. A viagem pelo Chile nos vagões da Transandina me levava ao paroxismo das emoções de um livro de realismo fantástico. Sua passagem pelo Paraguai, incluindo a Província do Chaco, era como rever aulas de História, só que não a Oficial. Foi aí que entendi a covardia da Triple Entente contra um pequeno país de povo heroico, a humilhação que lhes foi imposta por D. Pedro II, o ódio e ressentimento contra os brasileiros e a consideração do nosso país como imperialista frente aos Guaranis. Foi Hugo que me falou da existência dos Montoneros argentinos e Tupamaros uruguaios. Mas, o que mais me interessa agora, é lembrar sua descrição sobre a Venezuela. Até aquele dia de extensa aula, a única visão que tinha de nosso grande vizinho ao norte, eram cartões postais de centenas de postos de petróleo espalhados pela Baía de Maracaibo e fotos de praças bem cuidadas e com estátuas equestres de Bolívar e Sucre. Foi Hugo que me relatou o drama do povo venezuelano, espalhado por imensas favelas miseráveis no entorno de Caracas; uma cruel distribuição de renda que apenas permitia a existência de duas classes sócio-econômicas: riquíssimos, como nosso banqueiro acima e absolutamente miseráveis, todo o resto. Não havia classe média, produção, nada! A Venezuela era um apêndice dos Estados Unidos da América, como se fosse um Porto Rico ou um Havaí só que produzindo petróleo a rodo, barato e TODO exportado para os americanos, via das suas companhias petrolíferas que dominavam o mercado em um oligopólio monolítico. Hugo foi meu mentor e professor de Marxismo Humanitário, aquele que mantém o espírito crítico, não esbraveja pelo fanatismo nem comemora a "união das classes operária e campesina" com Whiskey escocês nos happy hours acompanhando a tchurma do PPS. Quando Chávez assumiu o poder, em 1998, fui tendo notícias do quê ele estava fazendo pelas massas miseráveis da Venezuela. Praticamente acabou com a miséria, sempre com programas de aumento nominativo de renda, como se faz no Brasil. Nacionalizou o que pode e empurrou as elites para seu devido lugar. Evidente que qualquer pessoa que teve saciada sua fome e aumentado seus horizontes, não se preocupou em saber o quê estava sendo feito para perenizar essas medidas. Aí Chávez, como todos os caudilhos da neo-esquerda, fez o que todos fazem: trocou as bolas, assumiu poderes ditatoriais e não exercitou qualquer planejamento para enfrentar o futuro. Castro, Stalin, Mao e todos os grandes líderes da esquerda pragmática, a seus tempos, foram diminuindo injustiças sociais seculares, garantindo um mínimo de dignidade humana à população antes desassistida, com boa educação, saúde pública e um mínimo padrão alimentício acima da linha da fome. As ações de Lula, Morales, Correia e Chávez, na América Latina, procuraram militar nesse sentido mas sempre tentados pela mosca azul do poder incontrolável e do pensamento único que leva, e levou a todos, a ditaduras muitas vezes sanguinárias, anulação dos contrários, eternização no poder, castração das liberdades de pensamento e de ir e vir. Em nome do pão, do ovo, do hospital e da boa escola, retiraram do povo o direito de sonhar com algo mais, sempre achando que o que vem depois do essencial é sempre a praga capitalista. O homem que morreu há algum temps e foi só ontem declarado oficialmente morto, teve tudo (a força do povo a seu lado) para construir um paraíso na Venezuela. Mas, como seus companheiros de socialismo bolivariano e caboclo, trocou tudo isso por um projeto pessoal de assalto e escalada ao poder a todo custo. Chávez deixa uma Venezuela incerta, sem parque industrial, importando tudo o que consume, desde alimentos pois não há agricultura nem pecuária, com uma hiperinflação já instalada, ou seja, jogou no lixo todo o humanismo que conquistou, encantado com o canto de Penélope, inebriante e embriagador, do poder a todo custo, do poder pelo poder. Como se viu, não era imortal e a incerteza paira sobre o futuro do país. Nu fundo, o Comandante não preparou a sua sucessão, como o fizeram Lula e os Castro e parecem pouco fazer Morales, Correia e Christina Kirschner. Pois é justamente nessas horas que a direita se ajeita na poltrona, dá o bote e vai tudo por água abaixo. Simples assim!
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