sábado, 15 de junho de 2013
Honestino!
Tenho a mais absoluta certeza de que, em muitos dos meus escritos memorialistas, há os que desconfiam da verdade sobre o que descrevo. Infelizmente ninguém nasce com a tarja de HONESTO E COMPETENTE escrito na testa, daí a proliferação de tantos ladrões mentirosos neste lado da fronteira. O que posso falar é que, muitas vezes, quase sempre sem querer, somos testemunhas oculares da história como aconteceu nos últimos momentos em liberdade, de Honestino Monteiro Guimarães, que presenciei ao lado de Vladimir Meirelles de Almeida grande amigo dos tempos de UnB (Matrícula UnB 185-66, junto com Mário Célio Caetano, 510-66 e Luciano de Mello Figueiredo, 18-66. A minha era 118-66), goiano de Morrinhos, filho de ferrenho comunista (ele homenageava Lenin no nome e seu irmão mais novo, Andrei, imagino que o eterno Chanceler soviético Andrei Gromiko, um ícone eterno da diplomacia internacional). Vladimir deve ser, hoje, funcionário aposentado da Câmara Federal. E ele estava comigo nos fatídicos momentos já descritos em outra crônica, com a riqueza de detalhes que me é peculiar, infelizmente. Quando cheguei a Brasília, em dezembro de 1964, meu irmão André, comunista por formação, convencimento e proselitismo me deu lições sobre o marxismo (muito bem abrilhantadas pelo José Araripe de Souza Jr. e sedimentadas pelo andarilho revolucionário colombiano, Hugo Arango Fernandez, em passagem pelo Brasil e hospedado em casa). André não era filiado a nenhum movimento ou partido, mas era confiável e com livre trânsito entre todas as tendências. Em meu primeiro passeio em Brasília, me levou direto à UnB para conhecer as pessoas que enfrentavam o regime ditatorial, sendo minha primeira parada a sede do CA (Centro Acadêmico da UnB) dirigido por Honestino Monteiro Guimarães. Impressionou-me a fraqueza física evidente de um revolucionário de escol: baixinho, joelhos arqueados para trás, pele avermelhada de tão branca, cabelos louros naturais e cacheados como o Pequeno Príncipe idealizado por Saint-Exupèry, porém meio enferrujados. Os olhos eram azuis mas apertados, pequenos e escondidos por um quádruplo fundo de garrafa. Vivia ora sorrindo, ora rindo solto, mexendo os ombros, naquele riso que todo o corpo participa. Meu irmão o tratava com mais que respeito, deferência e admiração. Ouvia sua prosa solta como se fosse um grande mestre e que ele era na verdade. André me explicou o que cada um fazia sem praticamente comunicarem-se uns com os outros: turma do Partidão de Prestes, o Cavaleiro da Esperança, recebia financiamentos para as campanhas revolucionárias; PCdo B, da linha mais independente do Albanês Enver Hodjxa, não se bicava com a turma do Partidão pois foi um cisma que saiu dele. Os Maoístas eram abrigados na POLOP (Política Operária) e reivindicavam a luta armada desde sempre. Tinha o pessoal da AP, também chamada de Associação dos Cristãos Comunistas, ligados à esquerda católica. Além disso, havia os ultrarrevolucionários VAL-Palmares e MR-8, defensores e praticantes da luta armada sempre. Honestino bailava livre entre todos, com aquela aura dos líderes internacionais, aqueles que têm seguidores. Conheci meu ex-sogro, já falecido, Gerson, em um depósito de ervas e temperos, no atacado. Apresentou-me a seu sócio que só chamou de Monteiro e me falou que era o pai de Honestino. Monteiro tinha espírito guerrilheiro e mostrou ao Gerson e mencionou para mim, seus planos para explodir o oleoduto Rio - Belo Horizonte, nunca concretizado. Sua esposa, Da. Maria Rosa, com cara de Madona muito sofrida, era muito amiga de minha ex-sogra, Da. Graci e seu irmão mais novo, Norton, era colega de Elefante Branco de minha ex-esposa. Só me mencionou Luiz Carlos, o irmão do meio, en passant. Ela me falava sobre o ativismo político de Honestino, e a neutralidade de Norton que absolutamente não se intrometia em política nem, muito menos, nas atividades do irmão. Da. Maria Rosa fazia novenas com Da. Graci com medo que acontecesse ao filho o destino que afinal ele teria. Honestino não era um brilhante orador já que seu carisma não vinha da arte de Fidel. Mas quando ele falava, nas Assembleias Gerais do CA, levantava os estudantes em delírio, com suas argumentações. Honestino Monteiro Guimarães sumiu naquela tarde de terça feira e nunca jamais ninguém o viu vivo. Vezes há em que passa um vento brando mas morno que eu identifico como seu espírito inquieto passeando pelo país. No fundo, Honestino vive. Graças a Deus morreu antes de presenciar o quê seus companheiros, camaradas e contemporâneos fizeram e fazem no Brasil de hoje. Deus, no fundo, foi muito com com o Ateu Honestino. Simples assim!
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