quarta-feira, 28 de novembro de 2012
Bom dia para golpistas e golpeados
Ah os estelionatários e seus golpes. No início dos anos 50, quando eu tinha uns cinco anos de idade, via meus pais rirem muito sobre um tal de “Filipeta”. Como meu pai me falava quase tudo o que eu perguntava, e ele sabia responder claro, indaguei-lhe sobre a tal filipeta e ele me explicou que tinha sido um golpe aplicado no comércio do Rio de Janeiro, por um Coronel da FAB chamado Luiz Felipe de Oliveira, que montou um belo escritório na Rua México e, com sua beleza, porte avantajado e vestes de dândi, pedia dinheiro alto consignado nos Bancos, comprava carros e eletrodomésticos a prazo e os revendia à vista, por preços abaixo do mercado. Obviamente que essa corrente ia quebrar um dia mas, vejam só, logo uma belezura enganada pelo galã que, inclusive, tinha passeado bem por sua alcova, denunciou-o à polícia que o prendeu já com malas cheias de dinheiro e passagem para Nova Iorque. O Coronel ia se escafeder no dia em que foi engaiolado. Estranhamente foi logo julgado, condenado e pegou acho que 15 anos de xilindró, morrendo por lá mesmo. O importante é saber que esse golpe ficou por muitos anos no imaginário popular. Recordo ainda que, seguindo o raciocínio, meu pai aproveitou para chamar meu irmão e dar-nos uma aula completa dos golpes conhecidos na época (e que são aplicados ainda hoje). O conto do vigário remonta ao longínquo século XVII quando dois vigários disputavam o direito de abrigar uma imagem de Nossa Senhora entre as capelas do Pilar e da Conceição, das quais eram párocos, decidindo soltar um burro no meio do caminho, e guardar a imagem na igrejinha para a qual o burro se encaminhasse. Ele foi para a do Pilar mas, descobriu-se depois, o burro já lhe pertencia e, como todos sabem, burro só toma o caminho de casa. Sinônimo de estelionato e esperteza contra os incautos, desde aquele tempo, o conto do vigário ficou nominando as histórias de heranças fabulosas, quase sempre deixadas por vigários sem herdeiros, pedindo-se dinheiro adiantado para custas e despesas. Exatamente como se faz no Século XXI. O conto do paco exige dois meliantes e geralmente uma grande fila de Banco. Um é o fila que leva um pacote enorme de dinheiro (na verdade papel cortado tendo uma cédula de verdade em cima, geralmente com um selo de um banco e ligas fechando-o e o deixa cair no chão; o outro é o grupo que pega a “grana” e esconde-a do fila e daí se desenrola a trama que termina com o incauto deixando suas economias nas mãos do grupo, torcendo as mãos para contar logo sua “fortuna”. O conto do bilhete premiado segue os mesmos caminhos do anterior, só que o paco (pacote de “dinheiro”) é substituído por um bilhete premiado, claro que em sorteio bem anterior. Essas variantes foram se aperfeiçoando até chegar ao “boa noite cinderela” e toda a pletora de vigarices contemporâneas com o uso da internet, celulares, programas de tv e dezenas de outras falcatruas. Evidente que meu objetivo, neste artigo, não é o de contar a história dos contos ou explicar como escapar deles. Meu desejo é constatar um fato que me assusta: cada vez um número maior de pessoas de boa escolaridade, idosos com muita experiência de vida, gente até do ramo financeiro, são vítimas frequentemente relatadas em todos os noticiários da TV. Minha mãe era uma mulher que se pode chamar de esperta. Boa de conta e excepcional para ganhar dinheiro em negócios, Rapidez de raciocínio e muita lucidez em analisar fria e velozmente uma situação, essa mulher caiu em um Conto do Bilhete Premiado, em 1990, na fila do Banco do Brasil do Valparaízo I, cidade dormitório de Brasília, onde morava com meu pai. Verificou o conto, felizmente, a tempo de alertar um policial que estava no Banco e que correu atrás e prendeu os vigaristas, com todo o dinheiro, em um Supermercado perto. Quando ela chegou em casa, meu pai ria muito e ela tentava explicar o inexplicável: COMO uma pessoa tão lúcida e que dava aulas dos meios de escape dessas espertezas caíra, justamente aos 67 anos, numa trama tão simples. Quando ela se afastou da discussão meu pai me segredou o que me pareceu a única resposta plausível: Filho, as pessoas caem nesses contos pois SEMPRE ACHAM QUE SÃO MAIS ESPERTAS QUE OS BANDIDOS E, NA VERDADE, ELAS É QUE ESTÃO DANDO O GOLPE NELES E AÍ QUE MORA O PERIGO!!!! Meu sábio pai, quanta saudade! Hoje, mesmo com a evolução fantástica da tecnologia aplicada nos golpes, sempre existe um componente quase pétreo em todos (ou na maioria) deles: algum dinheiro adiantado na esperança de ganhar uma fortuna em troca! Eu fico olhando as centenas de vítimas, falando de costas, com a cena sombreada, a voz modificada mas sempre declarando o valor que perderam e que vai de 50,00 a 20.000,00 reais. Nessas horas, não vou mentir nem esconder meus sentimentos. A figura de meu pai dizendo aquelas palavras sempre fica pairando por perto enquanto eu, invariavelmente, penso em voz alta: GUUEEEEEEENNNTA, filho da puta, vai aplicar golpe nos outros, vai! Simples assim!
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Quanta saudade de nossos sábios pais!
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