Em uns lugares mais e em outros
menos, parece ser muito difícil as pessoas, obviamente no meio social (em
contraposição, por exemplo, ao ambiente familiar ou ao própria recesso da
intimidade) exibirem comportamentos e emitirem opiniões sobre assuntos
complexos, polêmicos, não pacíficos e
“perigosos”. Há uma espécie de sentimento ubíquo, um inconsciente coletivo
óbvio (de C. Jung?), um tipo de pathos
metafisico, de Alvim Gouldner, pairando sobre a dificuldade que os seres
sociais têm de expressar em público opiniões que guardam para si mesmos ou, no
máximo, para um seletíssimo grupo de privilegiados que merecem a verdade. Por
ser uma pessoa prolixa, um professor que adora dar aulas presenciais, sem
geringonças eletrônicas, inclusive microfones, muitas vezes sinto que rompi
aquele tênue tecido onde a sinceridade, o politicamente correto e a hipocrisia
se confundem, possuem fronteiras não muito delimitadas. Percebo que há alunos,
como de resto pessoas em lares e bares, que fecham a cara e, mesmo não tendo o
desassombro de emitirem críticas no ato, passam a me tratar com certa reserva.
Penso que já estou muito velho para conviver com estas coisas e não gostaria de
deixar de me pronunciar publicamente sobre elas. Os exemplos falam melhor: você
lembra, tendo sido de classe média como fui um dia, no ensino básico (no meu
tempo chamava primário), mesmo em escolas públicas como frequentei, um certo
desconforto no ar quando raramente você tinha na sala um aluno negro? Hoje já
parece vencido esse maldito preconceito, mas cresci ouvindo minha avó dizer
coisas como: eu tenho pavor, na volta da igreja (no caso, a Assembleia de Deus,
centenário e pioneiro templo da fé pentecostal no Brasil) à noite, de cruzar
com um negro! Pano rápido! Você tem ou teve um amigo ou amiga que é (ou é pai
ou mãe de um) homossexual de ambos os sexos? Você sabia lidar bem com isso?
Você já teve próximo a si um amigo homossexual que nunca saiu do armário e teve
ou tem que fingir pra ele(a) que tem certeza que ele(a) é hétero, que não sabe
que ele é homo? Sou advogado e professor mas, em certas regiões do país, me é
proibido, nessas condições, andar de ônibus ou morar em locais humildes sob
pena de ser considerado um pária. Conviver com comportamentos sociais desviados
é terrível e já senti isso na pele. Há certas patologias que mais explodem no
ambiente social, mesmo tendo origem genética. Os vícios do jogo e do
alcoolismo, por exemplo! Dois tios meus morreram em mesas de jogo e eu nasci
com esse gene. Por anos, depois que se manifestou o prazer da adrenalina dos
cassinos clandestinos, sofri amargamente o peso dessa maldição. Muito tempo
antes da morte de minha mãe, já em Fortaleza, consegui me afastar desse
comportamento mas sei que não estou curado dele pois ele não tem cura. A
vigilância é a mesma do que a do combate ao alcoolismo: não posso “tomar o
primeiro gole” pois sei que tudo desanda e o inferno recomeça. O pior é
enfrentar a desconfiança dos que me são caros. Mas só eu sei o que fiz para me
livrar disso. Hoje parece uma tempestade que desapareceu mas sei que o preço da
liberdade é a eterna vigilância. Tenho certeza que se vacilar vou morrer mais
cedo pois, no jogo, você bebe e fuma e meu estado de enfisematoso controlado
não me permitiria isso. Tenho visto o craque Adriano e sua luta ainda inglória.
Todo mundo sabe que ele é alcoólatra e que suas frequentes “faltas” a treinos e
tratamentos nada mais são que a ressaca intransponível. Nenhum veículo de
comunicação fala do problema abertamente. Ninguém tem coragem de chama-lo de
alcoólatra com medo das retaliações judiciais. Ele mesmo admite gostar de uma
“cervejinha”. Esta era a palavra ou melhor , o sofisma usado por Sócrates (o
“Doutor” não o filósofo) desde a primeira internação na UTI, já se acabando de
cirrose. Sua mulher teve o desassombro de afirmar que, mesmo após a primeira
internação ele já acordava tomando doses enormes de vodka, vencido por um vício
tenebroso (a respeito disso penso que todos deveriam assistir ao filme com
título em português de “Vício Maldito” e em inglês de “The day of wine and
roses,” com interpretações antológicas de Jack Lemonn e Lee Remick)” Muito
gostaria que Adriano lesse este meu depoimento e não se iludisse com o silêncio
da hipocrisia social. Admitisse que é alcoólatra, frequentasse os AA e
enfrentasse seu drama com desassombro e muito, mas muito, sacrifício. Penso que
ele ainda pode voltar a ser um grande atleta. Eu detive o meu drama pessoal aos
62 anos (hoje tenho quase 65) já com enfisema, desempregado, com 107 kg, 400 mg
de glicemia em jejum, pressão de 18 por 12 e respirando à custa de citrovent e
berotec 4 vezes ao dia. Se ele me visse hoje, sobrevivendo às minhas custas e
trabalhando até nos fins de semana e feriados, 82 mg de glicemia em jejum,
pressão arterial 11 por 7, 94 kg e tendo feito uma espirometria, há dois meses,
que deu meus pulmões como normais, certamente poderia parar sua autodestruição
e voltar a ser o Imperador que tanto nos encantou nos gramados do mundo.
Silenciar sobre os porres é se destruir muito jovem. Ninguém que hoje cala
sobre sua situação, vai ajuda-lo amanhã. Como aconteceu com o “Doutor”. Como
seria bom que pudéssemos explanar livremente nossas opiniões e análises sem
medo de ser tachado de preconceituoso. Simples assim!
Pobre Adriano...não fosse o cachaceiro que é seria o 9 da Seleção sem titubear!
ResponderExcluirHoje, é apenas mais um ex-jogador em (in)atividade!