Ah! Que saudade da nostalgia. Sinto que meus escritos são
profundamente nostálgicos e uma ode ao saudosismo. Parece que não me encaixo no
mundo contemporâneo. Mas o quê fazer se não consigo me entender bem com certas
nuanças dos tempos de hoje. Uma antiga e querida amiga me mandou um PPS sobre a
saudade de nossos médicos de outrora. Foi o bastante para me estimular os
neurônios à mesma situação. Sou professor universitário há 16 anos, cursei
faculdade entre 1966 e 1970 (fora o mestrado terminado em 2001) e comecei a
estudar (tirando a alfabetização com a Profa. Bebê) na Escolinha da Professora
Eugênia, na Gentil Bitencourt, em 1954,
com sete anos incompletos. Incrível como me lembro de sua irmã, Profa. Helga,
que liderava as classes de primeiro e segundo anos primários. Por certo que a
severidade era comum e alguns cascudos eu tomei por traquinagens em sala. Mas
como era doce o olhar da minha professora. Naquele tempo ninguém chamava
mestras de tias pois a designação “professor” trazia em seu bojo qualidades e
valores essenciais à compreensão da vida. Naquelas eras pegava muito bem ser
professor. E ainda havia excelentes preceptores (professores que moravam em
casas de aluno e vice-versa, notadamente os vindos do interior). Passasse algum
na frente de minha casa e era imediatamente cumprimentado por meus pais e avós
com um tom respeitoso e de muita admiração. Nesse mesmo diapasão transcorreu a
maestria de meus professores no restante dos anos primários nos Grupos
Escolares Municipais. Lígia, Maria José; todos ocupam galardões profundos em
meu coração. No ginásio e científico a diferença foi pouca pois nos Colégios
Maristas os Irmãos (de batina, babador, colarinho e cordão à cintura comprovando
os votos de castidade, humildade, pobreza e serviço à Maria e à Igreja) é que
ensinavam. Aliás, nesses lugares quase santos, tudo se educava, inclusive a
formação cultural, moral, física e religiosa dos jovens. Em suma, não só
transmitiam o conhecimento mas formavam caráteres. Quando pus meus filhos para
estudar no Colégio Marista de São Luís, poucos Irmãos se mantinham na ativa;
quase todos os professores eram contratados e nem mais a visita do “caçador de
talentos” para levar candidatos para o Seminário Marista de Apipucos – PE,
havia. Mesmo na universidade meus mestres eram vetustos mas não ocos de
vaidade; gostavam das pompas e circunstâncias da Cátedra sem humilhar seus
discípulos. A velocidade do conhecimento não era transmitida nos anos-luz da
internet e nem computadores havia. Mas, além disso, eles também transmitiam O
SABER, coisa que não se faz mais. Raramente visitava a sala de um professor,
fora do horário de aula. Presava a ética que não recomendava conversas a portas
fechadas e, jamais, nunca eu me sentiria à vontade para cutucar a barriga de um
mestre. Outra profissão que me encantava era a dos homens de branco. Como eles
tinham tempo para conceder ao paciente nas consultas. A famosa anamnese médica,
aquele diálogo longo e privado com o paciente foi substituída pelo excesso de
especializações (aquelas da piada onde o cara é especialista em testículo
direito; se o problema for no esquerdo ele nem te recebe) e pelos meios
modernos de diagnose. Se uma epidemia de Gripe A se espalha e você tem acessos
de espirro e tosses, notadamente se você compuser o grupo de risco, claro que
procura um médico. Ele quase nunca lhe olha nos olhos. Já vai disparando três
ou quatro requisições de exames escalafobéticos onde você é escaneado dos pés à
cabeça, só para ver se tem uma gripe. As salas de espera nos consultórios são
abarrotadas de gente e seu atendimento é por ordem de chegada. Você adianta
duas horas mas os médicos, via de regra, atrasam três e acaba não compensando.
Se você compra um Plano de Doença aí lhe marcam um cateterismo pré-enfarte para
daqui a três meses. Aí você morre antes. Se vai pelo SUS até que consegue umas
brechinhas e ele, pelo menos, responde pelo alto custo dos tratamentos mais caros.
Mas se for emergência ou urgência (aliás, alguém já lhe explicou a diferença?
Para mim tentaram mas não entendi!) esteja certo que vai para o corredor se não
tiver a sorte de morrer primeiro. Mesmo que você tenha grana e procure um raro
generalista, os Clínicos Gerais em extinção, ele não terá a menor paciência em
espichar o diálogo, pelo menos para lhe dar um prognóstico do que pode lhe
acontecer doravante. Jesus! Eu sou do tempo de um Vade Mecum denominado “O Médico do Lar”, livrão muito grosso e de
capa dura onde, em simples ordem alfabética, lia-se sobre as doenças conhecidas
e os tratamentos disponíveis. Se os sintomas batiam e era coisa nova, mamãe
levava no Hospital da Aeronáutica de Belém para sermos examinados e tratados
pelo Dr. Olavo Leôncio, Cirurgião Geral mas que entendia de unha encravada a
câncer. Se a coisa parecia mais simples, toda a tarde passava na porta de casa
o Dr. Osmar Sampaio, médico e major da Polícia Militar. Vinha de ônibus, todos
os dias. Descia na Av. Independência e passava defronte a nossa casa em direção
à sua, na Conselheiro Furtado ou Gentil. Todo de branco, com divisas e um quepe
que eu achava um charme. Era baixinho, careca e gordinho, além disso torcia
pelo Remo, time odiado por mim e por toda a família de minha mãe. Mas seu
sorriso era uma pomba voando no horizonte ensolarado. Suas prescrições eram
fatais..... para as doenças que nos acometiam. Todo o dia lá vinha ele, batia
palmas ao portão, entrava e sentava no páteo; era quase 18 horas. Desciam eu ou
meu irmão para abrirmos a porta e conversarmos com ele pois mamãe,
invariavelmente, estava no andar de cima com enxaqueca, as quais ele muitas
vezes curou com Novalgina ou Anador, na veia, misturado com soro glicosado. Ficava
conversando conosco até perto de 19 quando já tinham chegado o Cacá (meu avô
postiço paterno) e o próprio papai, quando não estava prevaricando. A conversa fluía
fácil: futebol, política, seleção brasileira de 54 e 58, piadas, coisas do
cotidiano e, pasmem, até os nossos exames de língua de fora, ausculta cardiorrespiratória
(com direito a falar 33 e tudo o mais) e toque nos gânglios. Às vezes o papo
era tão bom que a febre de garganta sumia. Claro que os diagnósticos evoluíram muito
e a expectativa de vida é bem maior. À época, depois dos 40, o cigarro levava
muita gente de colapso cardíaco (com se dizia então); pessoas que passavam de
60 já espantavam os circundantes. Quando morria algum gordo, já que gordura era
sinal de saúde, todo mundo dizia: morreu com todo o corpo, claro que para
diferenciar daquelas moléstias que descarnam lentamente. Não sei se é vantajoso
viver-se mais. Sou tentado a pensar que bom seria viver-se melhor e mais feliz.
Qualidade ao invés de quantidade. Pra que ultrapassar os cem sem poder usufruir
os melhores gozos que a vida lhe oferece? Tenho que reconhecer: quanta saudade
dos mestres e médicos de outrora. Certamente sentirei muita falta deles quando
chegar a minha hora. Simples assim!
Realmente, bons médicos e excelentes professores serão sempre lembrados por nós.
ResponderExcluirDe alguns, é fato que não me esquecerei jamais!
Pena sofrerem com o desrespeito salarial....dia desses abriram um concurso aqui por perto cujo salário dos "doutores" girava em torno de 1.500 reais.
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