sexta-feira, 16 de janeiro de 2015

O NOME DA ROSA

Se você não sabe ou nunca aconteceu com você, saiba que as crianças amam o amor romântico. Se apaixonam e sofrem de chorar a ausência, sentir falta, ainda que seja tudo platônico. Quando mudei de casa e fui morar, aliás, fomos morar, eu e minha pequena família, numa ampla casa de dois andares, estilo modernóide mas, para mim, um sonho. O que havia de melhor era o Grupo Escolar Vilhena Alves, bem na esquina, onde fui fazer meu terceiro ano primário (perdoem mas nunca soube fazer a correspondência com o equivalente atual) e tinha oito anos. Nunca tinha estudado em colégios pois minha mãe gostava da Bebê, uma professora que me alfabetizou em casa, aos cinco anos e me ensinou o currículo oficial até o segundo ano. Assim, aos oito anos fui à minha primeira sala de aula. Logo que a vi, senti uma coisa muito estranha, um desacerto inexplicável que jamais sentira antes, o coração disparou e eu fiquei como se só ela existisse no mundo, naquela hora. Era Lygia minha professora. Consigo lembrar do seu corpo e do seu rosto como se ela estivesse na minha frente, agora. Extremamente branca, de sapatos baixos de cor preta e saia e blaser pequeno azul quase marinho e blusa branca por dentro da saia e com a gola cobrindo a do blazer. Cada dia a mais que passava eu sentia esse sentimento tomar conta de mim. Era um sofrimento atroz na hora de ir embora, quando a "campa" (sino em Belém) batia , inversamente, o sol voltava a brilhar quando eu a via. Acho que durante o ano letivo de 1955 ela nunca me chamou pelo nome (exceto na chamada, ao fim da aula) e eu poucas vezes, ou nenhuma, me dirigi a ela. Era muito gago e temia que ela descobrisse minha paixão na entonação tremida e claudicante de minha voz. De muito chorar à noite, de saudade,  ao dormir, baixinho pra meu irmão não perceber, o amor doeu mais do que o necessário e passei a viver de novo. De repente, olhei com outros olhos para Rosália, colega de onze anos que já tinha peitinho e dividia a carteira comigo. Rosália me cobria de mimos e não ria da minha gagueira. Falava rindo, fazia a ponta de meu lápis com gilette, pois eu não tinha a menor habilidade pra isso. De repente minha mãe achou que eu não estava progredindo e me tirou do Grupo e me fez ir para o quarto ano da escolinha da Professora Eugênia, uma casa de residência transformada em escola, com os quartos servindo de salas de aula. Perdi Lygia e Rosália. Duríssimo golpe! Mal eu sabia o que estava por vir. Já sentindo os alvores da puberdade, fiquei na sala do quarto ano, que tinha mesa grande e bancos corridos. Professora Olga, filha da dona era duríssima e batia nos nossos braços com uma régua de 40 cm que brandia por qualquer coisa. 11:30h começavam as chamadas, desde o primeiro ano e as crianças iam saindo. Um dia tive prova e a Profa. nos prendeu além da hora. Deu para ouvir a chamada da quinta série e, ao ouvir um nme, para mim apaixonante, de Nina Rosa, desabei quando ela passou. Era diáfana. Cabelos presos em rabo-de-cavalo, saia muito curta para os padrões da época e que me forneceu a primeira ereção de minha vida, mesmo que eu não tivesse a mínima ideia do que estava me acontecendo. Essa menina acabou comigo mas eu era muito feliz pois, doravante, ficava fazendo cera na porta até ela passar, na ponta dos pés com meia soquete (a única que usava em toda a escola). Seus cabelos eram entre o castanho claro e o louro. Nariz arrebitado e olhos esgazeados, claro que sem pintura. Me arrebatou até o dia em que passei mal e o veredito foi brutal: Hepatita A. Me tiraram de perto dela e, quando pensei que tinha melhorado, veio uma Hepatite B, seguida de insuficiência hepática. Fiquei bem mal. Me tiraram da escola e me mandaram pro Rio de Janeiro, pra fazer superalimentação e controle com melhores médicos, na casa de minha Tia Lucy em Copacabana. Sem que ninguém percebesse, fiquei desesperadamenrte longe de Nina Rosa e, enquanto o Douglas C-47, da FAB, de nº 2063, decolava eu senti que jamais veria Nina Rosa. Assim perdi-a no tempo e no espaço mas ficou na minha memória. Ficaram, aliás: Lygia, Rosália e a principal, o nome da rosa! Simples assim!

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